quarta-feira, 27 de junho de 2012

O HOMEM QUE DIZIA A VERDADE


            O HOMEM QUE DIZIA A VERDADE 


       Antigamente reinava na cidade de Siracusa, na Sicília, um tirano cruel e vaidoso chamado Dionísio. Vivia cercado de bajuladores, que não se atrevia a dizer senão elogios, embora o criticassem duramente pelas costas.
       Uma das vaidades de Dionísio era de se considerar poeta. Não perdia uma oportunidade de fazer versos. Reunia então os cortesãos  e recitava suas últimas composições. Todos aplaudiam e expressava admiração por seu gênio, louvavam a beleza da poesia e Dionísio ficava muito satisfeito.
                                                               
         O homem mais culto de siracusa era um filósofo chamado Filoxeno. Dionísio já estava tão envaidecido pelos repetidos aplausos dos cortesãos que mandou chamar Filoxeno para também ouvisse seus versos e louvasse seu talento de poeta.
          Filoxeno se apresentou, ouviu os versos, e dionísio mal podia esperar as palavras de admiração e louvor a sua arte. Mas, para espanto de todos, o filósofo afirmou que os versos eram tão maus que não mereciam ser chamados de poesia, assim como o autor não merecia o nome de poeta. Dionísio ficou fora de si diante de tamanha franqueza. Chamou os guardas, ordenou que acorrentassem Filoxeno e o levassem ao calabouço, destinado aos piores criminosos.
          Quando a notícia chegou aos ouvidos dos amigos de Filoxeno, eles ficaram indignados. Como o tempo passava e o filósofo continuava preso, enviaram a Dionísio uma carta pedindo a liberdade de Filoxeno.
          Talvez Dionísio temesse a ira de um bom número de súditos, ou talvez tivesse uma razão inteiramente diferente, como se verá. O fato é que Dionísio concordou em libertar o filósofo, com a condição de que viesse jantar com  ele uma vez mais.
          Filoxeno foi. Ao fim do grande banquete, na presença de todos os cortesãos, o rei se levantou e leu os novos versos de sua lavra. Queria que o filósofo, que só dizia a verdade, os ouvisse, pois achava-os excepcionalmente bons. Os cortesãos aduladores tinham a mesma opinião, a julgar por seus gestos e elogios. Apenas Filoxeno continuava em silêncio, sem nada dizer, sem a expressão do rosto traísse  seu veredicto.
          Não era absolutamente o que Dionísio esperava. Controlou a impaciência tanto quanto pode. Vendo que Filoxeno não se manifestava, o tirano dirigiu-se a ele com pretensa calma e, achando que ele não ousaria provocar novamente sua ira, disse:
          __Diga-me, Filoxeno, sua opinião sobre este meu novo poema.
          De fato, ninguém esperava a resposta que ele deu. Pois, dando as costas aos participantes do banquete, Filoxeno dirigiu-se aos guardas e disse, em tom de repugnância:
          __Levem-me de volta ao calabouço!
          Era a maneira mais clara de externar sua opinião. Sabendo que a honestidade resultaria em punição, escolheu o método mais direto. Preferia voltar à cela por sua própria vontade.
          Os cortesãos ficaram horrorizados diante de tão óbvia declaração. Apavorados aguardaram a reação de Dionísio. Mas o tirano, embora um poço de vaidade, tinha algum senso de humor e certo respeito pela coragem moral. Deixando os cortesãos trêmulos de medo, voltou-se com um sorriso para o imperturbável Filoxeno e deu-lhe permissão para ir em paz.
                                                                    (Do "Livro das Virtudes", William J. Bennett)